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"Sobreviventes – Depois do Terremoto" (2024)



Desde que os seres humanos passaram a se organizar em sistemas sociais e econômicos, eles também passaram a contar histórias sobre essas organizações e seus diferentes estágios. Metáforas que, com o passar dos anos, se tornam cada vez mais literais. Pensando no capitalismo, sistema que impera – e esmaga – grande parte do planeta, o cinema produz obras críticas com regularidade. Sobreviventes – Depois do Terremoto, que chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (18), é a mais recente reflexão sobre este monstro, vinda diretamente da Coreia do Sul. 

 

Com direção de Tae-hwa Eom, que assina o roteiro ao lado de Lee Shin-ji e Kim Soong-nyung, Sobreviventes – Depois do Terremoto encontra Seul completamente devastada depois de um terremoto. O único lugar que continua em pé é o edifício Hwang Gung, onde moram Min-sung (Park Seo-joon) e Myung-hwa (Park Bo-young), um jovem casal, e o misterioso Yeong-tak (Lee Byung-hun). Os sobreviventes do terremoto logo começam a se dirigir para Hwang Gung em busca de abrigo, e os moradores começam a buscar formas de proteger o prédio do caos que impera do lado de fora dos muros de suas casas. 

 

O que poderia ser classificado como um filme pandêmico – famílias presas em seus apartamentos, encurraladas em casa por um desastre de larga escala, sem possibilidade de escape – rapidamente evolui para uma reflexão sobre a estrutura social e a luta de classes. É fácil compreender o instinto inicial dos moradores de Hwang Gung de preservar suas residências, afinal elas foram adquiridas após anos de trabalho. São a realização de sonhos capitalistas, onde a medida do sucesso é a propriedade privada, um pedaço de chão para chamar de seu. Hwang Gung é o único prédio que continua em pé em toda Seul, comprovando que os investimentos de vidas inteiras foram acertados. 

 

Mas logo fica claro que aquela não é uma situação que será resolvida com brevidade. Não há informações sobre o que aconteceu. Não há resgates, não há Estado. Há apenas o Hwang Gung em funcionamento em toda a cidade, e seus moradores, motivados por um conjunto de sentimentos, buscam instaurar uma sociedade própria, em que apenas os moradores são cidadãos. Tem voz quem tem escritura. Um pequeno paraíso capitalista no meio da anarquia. 

 

Claro que, se só é cidadão quem é dono de uma fatia do Hwang Gung, os demais sobreviventes se tornam sub-humanos. Descartados pela única sociedade em funcionamento, entregues à implacável natureza e a ausência de um contrato social. Sobreviventes – Depois do Terremoto propõe duas possibilidades: a corrupção que o poder capitalista supremo exerce, e a possibilidade de uma comunidade baseada nas melhores qualidades humanas. O homem pode ser o lobo do homem ou sua própria utopia. 

 

Sobreviventes – Depois do Terremoto é o candidato sul-coreano ao Oscar de Melhor Filme Internacional e, apesar de ser um filme-desastre, entrega o esperado de um filme com esta pretensão. As atuações de Park Seo-joon e Lee Byung-hun são tocantes. Park Seo-joon interpreta um jovem que, aos poucos, descobre até onde está disposto a ir para proteger sua família. Já Lee Byung-hun é um herói tornado vilão que explora um sistema do qual sequer se qualifica para integrar. 

 

Com 2h10min de projeção, Sobreviventes – Depois do Terremoto é uma reflexão sobre o capitalismo vinda da barriga da besta: a Coreia do Sul é a 13ª maior economia do mundo, com uma influência global crescente. Uma produção que certamente merece audiência nesta temporada de premiações.



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