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"A Flor do Buriti" fará a sua estreia no Festival de Cannes



O novo filme de João Salaviza e Renée Nader Messora fará sua estreia mundial no Festival de Cannes, entre 16 e 27 de maio. A Flor do Buriti será exibido como parte da Seleção Oficial, na sessão Un Certain Regard, que também premiou a dupla em 2018, quando receberam o prêmio especial do júri com Chuva é Cantoria na Aldeia dos Mortos.


Novamente com os Krahô, no norte do Tocantins, o filme traz um dos temas mais urgentes da atualidade: a luta pela terra e as diferentes formas de resistência implementadas pela comunidade da aldeia Pedra Branca.


“O filme nasce do desejo em pensar a relação dos Krahô com a terra, pensar em como essa relação vai sendo elaborada pela comunidade através dos tempos. As diferentes violências sofridas pelos Krahô nos últimos 100 anos também alavancaram um movimento de cuidado e reivindicação da terra como bem maior, condição primeira para que a comunidade possa viver dignamente e no exercício pleno de sua cultura”, explica a codiretora Renée Nader Messora.


A Flor do Buriti atravessa os últimos 80 anos dos Krahô, trazendo para a tela um massacre ocorrido em 1940, onde morreram dezenas de pessoas. Perpetrado por dois fazendeiros da região, as violências praticadas naquele momento continuam a ecoar na memória das novas gerações.


“Filmar o massacre era um grande dilema. Se por um lado é uma história que deve ser contada, por outro não nos interessava produzir imagens que perpetuassem novamente uma violência. Percebemos que a única forma de filmar essa sequência era a partir da memória compartilhada, a partir de relatos, do que ainda perdura no imaginário coletivo desse pessoal que insiste em sobreviver”, conta a diretora.


A Flor do Buriti foi rodado durante quinze meses em quatro aldeias diferentes, dentro da Terra Indígena Kraholândia, e assim como em Chuva é Cantoria na Aldeia dos Mortos, a equipe era muito pequena e se dividia entre indígenas e não indígenas. Relatos históricos baseados em conversas e a realidade atual da comunidade serviram de base para a construção da narrativa do filme.


“A gente não trabalha com o roteiro fechado. A questão da terra é a espinha dorsal do filme. Propusemos aos atores trabalhar a partir desse eixo, criar um filme que pudesse viajar pelos tempos, pela memória, pelos mitos, mas que ao mesmo tempo fosse uma construção em aberto que faríamos enquanto fossemos filmando. A narrativa foi sendo construída com a Patpro, o Hyjnõ e o Ihjãc, que assinam o roteiro”, explica João Salaviza.


As manifestações em Brasília durante a votação do Marco Temporal e as ameaças que a Terra Indígena vem sofrendo nos últimos anos - roubo de animais silvestres, extração de madeira, reativação de uma barragem ilegal - são absorvidas pelo filme, em uma narrativa onde passado e presente coexistem e formam um corpo só.


“Os desafios que os Krahô enfrentam hoje ecoam em todo o nosso continente. O que contamos aqui, em um contexto extremamente específico e peculiar, é também a História dos povos indígenas sul-americanos desde a invasão. Se as formas de violência são múltiplas e capazes de aniquilar nações inteiras, as formas de resistência são ainda mais potentes, vibrantes e reinventadas diariamente”, conta Renée.


A seleção do filme para Cannes mostra que o mundo está realmente de olho nas questões dos povos originários no Brasil. “A importância dos povos originários não reside apenas no conhecimento ancestral, mas também na elaboração de tecnologias totalmente sofisticadas de defesa da terra. Eles ocupam radicalmente a contemporaneidade. O Festival também será importante como lugar para se formar novas alianças, usar da sua capacidade de sedução cultural que possam ser reativadas no futuro. De fato, o Bolsonarismo foi um verdadeiro massacre, tanto na destruição dos povos e seus direitos, como da terra. Agora, o que acontece é uma contraofensiva muito mais bela e forte. O mundo está de olho nos Krahô. É muito bom para nós, cineastas e aliados, ver o lugar que o filme pode ocupar”, ressalta João.


Sonia Guajajara, que também aparece no filme, é figura de admiração de mulheres de todas as aldeias, que vêem nela um modelo de referência. “Ela aparece em um discurso em Brasília sempre como ativista e hoje é uma Ministra, depois de décadas de militância. Vemos que há uma realidade muito rica e muito vibrante, com pouca visibilidade que é aquilo que acontece em cada aldeia. E é onde as comunidades organizam sua resistência, e isso hoje vem com tudo. E é um rio imparável que vai confluir. E a melhor notícia que o Brasil poderia ter depois desses quatro anos é a presença cada vez mais forte dos povos indígenas ocupando lugares de poder”, reflete João.


A Flor do Buriti é produzido por Ricardo Alves Jr. e Julia Alves, por meio da produtora mineira Entre Filmes, e será distribuído no Brasil pela Embaúba Filmes.


Sinopse


Em 1940, duas crianças do povo indígena Krahô encontram na escuridão da floresta um boi perigosamente perto da sua aldeia. Era o prenúncio de um violento massacre, perpetuado pelos fazendeiros da região. Em 1969, durante a Ditadura Militar, o Estado Brasileiro incita muitos dos sobreviventes a integrarem uma unidade militar. Hoje, diante de velhas e novas ameaças, os Krahô seguem caminhando sobre sua terra sangrada, reinventando diariamente as infinitas formas de resistência.

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